A ex-miss Angola Giovana Ferreira Pinto Leite é apontada como a principal suspeita de mandar falsificar várias escrituras públicas de compra e venda junto do Cartório Notarial de Viana, com o objectivo de se apropriar de 20 apartamentos em Talatona, pertencentes a três imobiliárias com as quais mantinha acordos de aquisição.
Redacção
O caso remonta a 2 de Maio de 2024, quando Giovana Pinto Leite, através da sua advogada Leda Mingas, conseguiu que o responsável do Cartório Notarial de Viana, Sala Fumassuça Mário, lavrasse 20 certidões — extraídas de escrituras públicas de sociedade e vendas inexistentes nos registos — correspondentes a 20 apartamentos, propriedades das sociedades comerciais Camomila – Sociedade Imobiliária, S.A., Vista Lar – Sociedade Imobiliária, S.A., e Azul Marinho – Sociedade Imobiliária, S.A.
O acto em si não teria constituído qualquer ilícito criminal ou levantado algum tipo de suspeição se, à data dos factos, os responsáveis das três imobiliárias — Carlos Alberto dos Santos e Rui Jorge Teixeira da Costa Reis — não se encontrassem fora do país.
Entretanto, o facto ainda mais intrigante é que, apesar da ausência dos dois empresários do país, o responsável do Cartório Notarial de Viana fez constar das referidas certidões que, a 2 de Maio de 2024, perante si, se apresentaram Carlos Alberto dos Santos e Rui Jorge Teixeira da Costa Reis (em representação das imobiliárias) e Leda Nahary Bettencourt Alberto Rodrigues Mingas (na qualidade de advogada de Giovana Pinto Leite).
Mais: o notário Sala Fumassuça Mário fez ainda constar das certidões que, perante os outorgantes, procedeu à leitura em voz alta das escrituras, explicando o seu conteúdo, assim como a Giovana Pinto Leite, dando conhecimento do acto no organismo responsável e verificando “presentemente” as assinaturas da advogada Leda Nahary Bettencourt Alberto Rodrigues Mingas e dos dois empresários, que se encontravam, na verdade, no exterior do país.
AGT entra em cena
Uma outra surpresa para Carlos Alberto dos Santos e Rui Jorge Teixeira da Costa Reis, a parte queixosa, deu-se quando quiseram saber em que situação fiscal dos seus imóveis estavam perante o fisco, com a informação de que todos os mesmos estavam inscritos no matriz fiscal em nome de Giovana Ferreira Pinto Leite.
“No âmbito das solicitações feitas à esta Repartição Fiscal, para esclarecimento de Imposto Predial sobre as transmissões referentes a imóveis existentes (…), informamos que na Repartição Fiscal está inscrita uma resposta da AGT às imobiliárias.”
Registo predial
Uma vez munida das mesmas certidões, extraídas das escrituras falsas, a advogada de Giovana Pinto Leite efectuou, junto da Conservatória do Registo Predial, a inscrição de todos os imóveis em nome da sua cliente — quando, por lei, o registo predial só pode ser feito mediante apresentação da escritura pública e do pagamento do imposto de Sisa.
Incumprimento contratual
A 25 de Março de 2024, isto é, pouco menos de dois meses antes do registo predial ter sido efectuado ao arrepio da lei, as imobiliárias haviam dado a Giovana Pinto Leite, em cartas protocoladas, 30 dias para que esta procedesse ao pagamento dos 20 imóveis.
Entretanto, segundo apurou o ISTO É NOTÍCIA, desde a data de expedição dos ofícios até ao presente momento, Giovana Pinto Leite não executou qualquer acto em relação às imobiliárias, tendo indo mesmo para o Fórum para pedir a sua condenação ao pagamento por parte das imobiliárias.
Processo-crime
Em consequência de uma denúncia feita, depois de uma abordagem mal-sucedida ao chefe do Cartório Notarial de Viana por parte das imobiliárias, o Serviço de Investigação Criminal (SIC), junto do Comando Municipal de Viana da Polícia Nacional, abriu o processo-crime para apurar as circunstâncias das falsificações das escrituras.
Ministério da justiça abriu inquérito
O !STO É NOTÍCIA sabe igualmente que o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos pôs em andamento uma ação inspectiva junto do Cartório Notarial de Viana, com a finalidade de apurar os meandros do sucedido, na sequência de uma outra denúncia apresentada àquele departamento ministerial sobre o mesmo assunto.
Segundo informações recolhidas junto de fontes ligadas ao Cartório Notarial de Viana, a referida ação inspectiva abrange todos os funcionários, já que, para além do ‘caso Giovana Pinto Leite’, existem outros descaminhos de verbas que não têm sido depositadas na Conta Única do Tesouro (CUT).
A ‘intrigante’ viagem de talatona a viana
Estão a ser objeto de questionamentos as motivações que teriam levado a advogada de Giovana Pinto Leite a recorrer ao Cartório Notarial de Viana, quando, em Talatona, onde estão localizados os 20 apartamentos, existem outras lojas que poderiam tratar do mesmo expediente, sem que tivesse a necessidade fazer uma viagem de mais de 25 quilómetros.
Venda de apartamentos
Este portal apurou, através de uma consulta a documentos do 1.º Cartório Notarial de Luanda, que dois dos 20 apartamentos já foram vendidos. Um dos quais, do tipo T2, foi alienado, a 9 de Dezembro de 2024, à sociedade comercial Patrimonium Loanda – Prestação de Serviços, Limitada, ao preço global de 80 milhões de kwanzas, pagos integralmente.
O segundo apartamento, do tipo T2A, foi vendido ao cidadão Hélder António Johnston Paiva, e custou o valor global de 120 milhões de kwanzas.
Os dois compradores devem agora enfrentar um impedimento legal de registro dos referidos imóveis, uma vez que os mesmos foram vendidos com base em escrituras fraudulentas. Ou seja, à luz da lei, o negócio é nulo.